Modelos de concessão precisam ser revistos
Investidores se afastam dos processos de licitação de infraestrutura por falta de estudos, avaliações e regras claras
“Sem um desenho que considere o multimodalismo e o desenvolvimento da logística do país, não se conseguem atrair investimentos. É necessário definir valores, priorizar os projetos e avaliar os modelos com antecedência para despertar o interesse da iniciativa privada”, afirmou o Vice-Presidente da concessionária de rodovias CCR, Ricardo Castanheira durante o Workshop de Logística promovido pela Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo) reuniu especialistas para debater os desafios da governança no processo licitatório.
Embora apresente falhas e ainda requeira ajustes, o modelo escolhido pelo governo para as concessões de rodovias é considerado o mais bem-sucedido entre as iniciativas do setor público para angariar investimentos para a infraestrutura do país.
O executivo afirma que são necessários projetos qualificados para dar andamento às concessões, com participação integrada da iniciativa privada e poder público: “a concessão só existe se o setor privado participar”, realça, apontando também para o excesso de agentes reguladores envolvidos no processo de licitação, em contraste com a ausência e omissão da iniciativa privada – o que gera dificuldades em toda a operação.
E, no entanto, Castanheira confidenciou que, para criar a lista atual de processos de concessão de portos, aeroportos, ferrovias e rodovias incluídos no PIL, o governo federal não fez mais do que apresentar as possibilidades ao setor privado sem que houvesse estudos, projetos ou cálculos quanto à maturidade das propostas. “Avaliando, algumas delas nem são sustentáveis, nas rodovias, por exemplo, há pedágios que não se sustentam, e esse tipo de discussão deveria ter acontecido antes”.
“É necessário batalhar pela viabilidade das concessões para atrair investimentos, com mais atratividade e projetos integrados”, insistiu, lembrando que a iniciativa privada tem um papel relevante na luta por esse objetivo: “está na nossa mão, e não temos como fugir dessa responsabilidade”.
O especialista em riscos, seguros e garantias sobre concessões de serviços públicos André Dabus, da AD Corretora de Seguros, afirmou o brasil está se preparando para uma melhoria que não deve acontecer agora: “estamos em uma onda que só será surfada depois de passarmos a arrebentação: porém o mercado existe e está aí para ser trabalhado”, parafraseia.
Segundo Dabus, há três grupos que podem se beneficiar das concessões: as grandes empresas que atualmente já ocupam o mercado, a exemplo da CCR, investidores internacionais, parte dos quais já está no país e outra que ainda poderá ser atraída, apesar dos entraves e riscos – e um terceiro grupo, que ele considera novo, mas que pode aflorar neste momento: as empresas de médio porte, que gradualmente vão aprendendo a usar contratos de obras públicas para desenvolver seus projetos, e já começam a avaliar a participação no mercado de concessões, criando um modelo de negócios que se baseia em concessões menores.
Entretanto, o investidor ainda precisa equacionar alguns problemas, que vão além das barreiras culturais ou burocráticas, principalmente a “financiabilidade”, os riscos e as garantias. Todos os especialistas concordam que um dos problemas cruciais dos modelos atuais de concessão é que eles atribuem todos os riscos e responsabilidades aos concessionários, desde as questões ambientais até mudanças de cenário econômico ou operacionais do próprio negócio. E tudo isso, sem oferecer garantias, o que deixa ainda mais gritante a necessidade de se ajustar o modelo, a começar pelos editais, mas também no teor contratual. “Da forma como está, os editais estão causando não apenas a ausência do investidor, como também do mercado segurador, que não é infinito e pode não aguentar”, alertou André Dabus.
Para os próximos projetos, Dabus aconselha que sejam avaliados os riscos, tanto gerenciáveis quanto não gerenciáveis, e as contingências a serem suportadas pelo próprio governo. Em seu ponto de vista, “tudo nasce ou pode morrer na matriz de riscos”.
Concluindo o painel de introdução que daria início aos debates, a Dra. Rosane Menezes Lohbauer, sócia da Madrona Advogados e especialista na estruturação de projetos de infraestrutura na modalidade de parcerias público-privadas, bateu firme na tecla do planejamento e da necessidade de se preparar editais mais qualificados: “É extremamente necessário preparar bons projetos, o que nem sempre tem acontecido”, alerta a advogada. Ela reconhece que a lei 11079 que contempla as PPPs (Parcerias Público-Privadas), trouxe avanços como a flexibilização dos contratos e redução das exigências legais, contemplando mais diretrizes para destravar os processos e acelerar os investimentos.
Na mesma medida em que o sistema antigo de concessões fazia com que nenhum processo conseguisse sair do papel, hoje o cenário é contrário, de acordo com Lohbauer: “os editais saem sem segurança jurídica e sem clareza suficiente para apontar desequilíbrios com antecedência.
Dra. Rosane Lohbauer concorda com André Dabus em que estejamos em um momento de preparação que, a seu ver, pode ser excelente para nos preparar para o futuro: “já que não temos muitos projetos em andamento, vamos preparar os próximos”, brinca ela, enfatizando que é necessário aplicar governança na execução contratual, ter conhecimento sobre o que está sendo licitado, e ainda assim isso não basta se os contratos não forem sérios, exequíveis, e de fato cumpridos. “Falta coragem para se preparar contratos e depois exigir que sejam cumpridos: nos modelos de concessão, o Estado precisa sair da função de operador e realmente aprender a passar para a função de regulador”.
De uma maneira geral bastante alinhados com a necessidade de se atrair investimentos para a infraestrutura do país, sejam eles oriundos de grandes ou médias empresas, ou os estrangeiros, atualmente fugindo dos certames brasileiros, os especialistas concordam em que os editais precisam ser revistos, estudados e avaliados, demonstrar riscos e viabilidades, além de serem geridos por agências reguladoras mais fortes e capacitadas tanto para exigir quanto para fazer cumprir.
Ricardo Castanheira ainda acrescenta que os desequilíbrios posteriores às licitações precisam atender ao código constitucional de poderem voltar às condições da proposta sempre que acontecerem, especialmente em contratos de longa duração como são os da infraestrutura viária.
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