Diante da crise, evolução ou oportunismo
Em seminário na AMCHAM, Marcos Lisboa chama a atenção para falta de produtividade e desequilíbrio demográfico
“Estamos ficando velhos, antes de termos ficado ricos”. Marcos Lisboa sempre traz frases de efeito para as suas palestras, e esta foi uma das que usou durante a abertura do evento promovido nesta terça-feira (04) pela AMCHAM (Câmara Americana de Comércio), em São Paulo. Abordando as perspectivas econômicas para o Brasil e para a economia mundial em 2017, a AMCHAM reuniu empresários e executivos de diversos segmentos, que puderam assistir às palestras de expoentes do mercado, além de compartilhar as suas expectativas para um ano em que o Brasil projeta, se não a retomada do crescimento, pelo menos o fim do declínio.
O economista Marcos Lisboa é presidente do Insper, instituição de ensino voltada para negócios, economia, direito e engenharia, e é considerado como referência para o mercado na discussão sobre as saídas da atual crise econômica e sobre o papel do Estado brasileiro nesse processo, por sua experiência como secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e vice-presidente do grupo Itaú-Unibanco. E o seu alerta principal à plateia da AMCHAM foi claro: apesar da primeira batalha na direção do impeachment, ainda temos de enfrentar problemas duros, e a previdência está entre as questões centrais.
Lisboa abriu a sua apresentação com um gráfico comparativo entre países, no qual comparou a produtividade e o grau de eficiência do trabalhador no mundo todo, colocando o Brasil em clara desvantagem não apenas em relação a países desenvolvidos, mas também a outros em desenvolvimento, como China, Índia, Coreia, Taiwan. E, mais uma vez, perdemos de goleada. Em seguida, o economista demonstrou os gráficos demográficos, comparando a produtividade brasileira ao crescimento populacional: “Nos últimos trinta anos, vivemos o que posso chamar de ‘bônus demográfico’, ou seja: tivemos uma entrada imensa de jovens no mercado, o que fez com que a proporção de pessoas que trabalhavam se mantivesse muito acima dos que se beneficiavam da previdência ou do mercado”, explicou, contrastando com a mudança clara na distribuição familiar que, de cerca de 6 filhos há 50 anos, despencou para 1,7 no ano passado, fazendo com que a proporção entre a população produtiva caísse drasticamente em relação à população dependente.
Outra característica destacada pelo presidente do Insper foi a disparidade entre empresas mais e menos eficientes, quando se comparam países desenvolvidos e em desenvolvimento. Segundo dados apresentados por Marcos Lisboa, há uma propensão por parte dos países com mais dificuldade (Brasil incluído) em permitir que as empresas menos eficientes cheguem de fato à falência. “Países subdesenvolvidos preservam os seus setores menos eficientes, quando é preciso deixar que as empresas ineficientes quebrem; é preciso que se pague o ônus da concorrência para que nos beneficiemos de seus bônus; é preciso permitir que os empregos sejam destruídos se eles vigoram somente no cenário da ineficiência, para que se construam empregos que tragam melhor produtividade”.
Os dados apresentados por Marcos Lisboa demostravam a seguinte estatística: e o Brasil produzisse os mesmos bens que os Estados Unidos, sua produtividade aumentaria em 68%. No entanto, se continuássemos produzindo exatamente os mesmos bens, porém com a mesma eficiência aplicada pelos Estados Unidos, o aumento seria de 430%. “O Brasil é pobre porque tudo o que fazemos, fazemos com menos eficiência”, avalia o especialista, exemplificando, como entraves à produção do país, o excesso de regras, o protecionismo industrial, a complexidade das leis trabalhistas e a disparidade formada pelas proteções tarifárias que geram desigualdades setoriais. “Não chegamos a essa crise à toa”, constata, com desânimo, questionando como podemos atrair investimentos diante dessa situação.
Quanto às perspectivas para o futuro, Marcos Lisboa fez um alerta para que tenhamos todo o cuidado com as manobras para desviar da crise, e que façamos um movimento em prol da evolução, e não do oportunismo: “Nas últimas décadas, o Brasil avançou motivado pelas dificuldades, sempre em reação à crise. Porém, desta vez é diferente: temos de encarar questões difíceis. Temos governos estaduais quebrados, folhas salariais insustentáveis, problemas graves na previdência, regimes de tributação que são completamente equivocados. A vida não está fácil para o brasileiro, mas qual será a nossa escolha? Evoluir ou aproveitar algumas brechas da crise de maneira oportunista?”.
Confira os destaques do evento Perspectivas Econômicas para o Brasil e para a Economia Mundial em 2017, promovido pela AMCHAM
"Se cada microsetor no Brasil tivesse a mesma produtividade atingida pela indústria americana, sem alterar a composição setorial, aumentaríamos a eficiência em 430%"Marcos Lisboa / Insper
"Alimento é o último setor a entrar em crise, mas neste ano, entramos. Devemos, no máximo, empatar". Edmundo Klotz, Presidente da ABIA (Associação Brasileira das Indústrias de Alimentação)
"Planejamento, política industrial, política antidumping e desenvolvimento de uma cultura estável de exportações. Não podemos exportar só de vez em quando". Fernando Figueiredo, ABIQUIM (Associação Brasileira da Indú
"O mundo está líquido. Atratividade de investimentos não deveria ser um problema. Mas precisamos resolver 3 frentes: sistema de garantias para as concessões, criação de debêntures de infraestrutura para trazer recursos do mercado de capitais e fim da volatilidade das taxas de juros".
Venilton Tadini, Presidente da ABDIB (Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base)
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