Por que o Shipping ficou de fora da COP 21?!

Nesta semana Barreto alerta: não acredito que os armadores não estejam tratando esse assunto com a devida seriedade

A versão final do documento produzido pelos participantes da COP21 (21ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas) foi bastante festejada pelos principais líderes mundiais por se tratar do primeiro acordo desse tipo firmado por 195 países. A despeito das históricas divergências entre os países ricos e as nações em desenvolvimento, todos os signatários do acordo se comprometeram a reduzir as emissões de gases poluentes e restringir o aquecimento abaixo de 2° Celsius, mantendo todos os esforços dirigidos para limitá-lo a 1,5° Celsius acima dos níveis pré-industriais (o que, segundo ambientalistas, ainda não será suficiente para evitar o alagamento de algumas ilhas e cidades litorâneas).

Artigo_7_2015_12_22_Barreto_imagem1_fotoUma das grandes polêmicas do texto final, contudo, foi a retirada de metas de controle de emissões para as indústrias de navegação e aviação. De um lado, um estudo publicado em 2014 pelo IMO - órgão também das Nações Unidas e que regulamenta o transporte internacional por via marítima, sustenta que os navios foram responsáveis por 2,2% das emissões mundiais de CO2 em 2012, o que significaria que o setor estaria na vanguarda desse tema dado que em 2007 os navios representavam 2,8% das emissões mundiais de CO2.

Para a ICS (International Chamber of Shipping), a associação internacional que representa cerca de 80% das empresas de navegação do mundo, a decisão de retirar do documento a menção à navegação foi acertada, uma vez que "uma indústria não pode ser tratada como um país e o papel de estabelecer as metas para o setor cabe unicamente ao IMO". A ICS argumenta ainda que, como efeito da COP 21, as economias terão que "descarbonizar", levando a uma rápida redução na demanda por combustíveis fósseis e, consequentemente, sobre a demanda por navios petróleo e carvão, o que, por si só, já representará uma grande contribuição do setor para o planeta.

Por outro lado, nem todos os associados da ICS estão satisfeitos com o ocorrido (como a Maersk, por exemplo), por temerem que isso possa levar a crescente criação de uma série de regras regionais despadronizadas e que poderiam tornar ainda mais complexa a operação dos navios, tais como as ECA (Emission Control Areas), áreas de controle de emissões, em vigor na Europa e América do Norte desde Janeiro de 2015 onde somente são permitidos navegar pela costa navios utilizando combustível com até 0,10% de Enxofre. A China anunciou recentemente algo semelhante (até 0,50% de Enxofre) para alguns de seus portos a partir de 2017.

Já para representantes de algumas das principais ONGs internacionais desse setor, tais como: Transport & Environment e Seas At Risk, o shipping responde por 5% das emissões globais e esse número pode triplicar com a não inclusão dessa indústria no texto final do acordo. As ONGs alegam que o IMO tem sido extremamente lento na definição de metas de redução de emissões e definição de políticas para um controle preciso das emissões dos gases dos navios.

A verdade é que 90% do comércio internacional é feito por via marítima e um objetivo absoluto de redução de emissões para a indústria como um todo não faria sentido, pois poderia limitar o crescimento do comércio mundial e prejudicar o crescimento e o desenvolvimento dos países. Ou seja, o caminho a seguir é concentrar os esforços nas reduções de emissões relativas dos navios e na melhoria da eficiência energética por meio de medidas técnicas e operacionais, conforme defendido por Maria Bruun Skipper, Diretora da Associação Dinamarquesa de Armadores, que lembra ainda que, “do ponto de vista de eficiência energética por tonelada de carga movimentada, os navios são meio de transporte mais ecologicamente correto do planeta”.

É fato que o preço do IFO 380 (combustível do navio) se estabilizando abaixo dos US$ 200  por tonelada – ante os cerca de US$ 600 de um ano atrás – poderia tirar boa parte da pressão por redução de consumo de combustível da lista de prioridades dos armadores. Por outro lado, com o LS 380 (combustível com 0,1% de enxofre) custando cerca de US$ 450 por tonelada, boa parte dos novos navios porta-contêiner encomendados aos estaleiros atualmente, notadamente os navios da Maersk, já estão sendo preparados com motores flex (IFO 380 e LNG), até mesmo para cumprir com as exigências Europeias a partir de 2020. A expectativa, entretanto, é de que ainda há muito o que os engenheiros e projetistas de cascos e motores de navios possam fazer para otimizar o consumo de combustíveis e minimizar as "pegadas de carbono" dos novos navios.

Sinceramente, entendo e concordo com a pressão dos ambientalistas, mas não acredito que os armadores não estejam tratando esse assunto com a devida seriedade.



Escrito por:

Leandro Barreto, Sócio-Consultor SOLVE Shipping

Administrador de empresas, especializado em economia internacional pela Universidade de Grenoble e em Inteligência Competitiva pela FEA/USP. Há mais de dez anos atuando no segmento, foi gerente de Inteligência de Mercado na Hamburg-Süd, professor pelo IBRAMERC e Diretor de Análises da Datamar Consulting. Atualmente, coordena projetos independentes de consultoria com forte atuação junto a armadores, autoridades portuárias, embarcadores e entidades públicas voltadas para o desenvolvimento do setor portuário.



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